quarta-feira, 4 de março de 2015

A nuvem

    Em 1983 éramos alunos da Escola de Formação de Oficiais da Marinha Mercante e fizemos uma viagem de instrução no navio de transporte de tropas Ary Parreiras. Um uma noite de olhar céu e nuvens uns cinquenta de nós fomos à proa do navio, contar histórias e vantagens. No decorrer das contações de vitórias e tragédias seguiram-se as histórias de terror, de assombrações, coisas sobrenaturais e outros exageros. Com tanta testosterona junto os causos eram ouvidos com muita coragem e bom humor. As histórias da região norte, de espíritos das florestas e outras lendas cresceram entre nós, sentados no convés do navio a navegar pelo mar do nordeste brasileiro. Alguns faziam suas narrativas com maior impacto pois acreditavam mesmo no que contavam. Outros pareciam estar inventando naquele instante uma lenda milenar, mas nem por isto tinham menos ouvidos atentos. Os espaços de silêncio entre as histórias foram aumentando até o momento em que alguém apontou o horizonte à boreste, mostrando a mais estranhas das nuvens, escura e sombria, a se aproximar do navio. Foi o suficiente para todos partirem em disparada pelas escadas em direção às cobertas. No mesmo instante o oficial de quarto anotava, sem sobressaltos, no diário a presença de "cúmulos cobrindo 5/8 do céu". Estas histórias que se contam, as teorias dos finais dos tempos, tomam proporções de desastre quando achamos que o perigo maior está apenas fora de nós, não é?




Créditos de imagem:  https://eco4u.files.wordpress.com/2009/09/24grcumulonimbus.jpg