domingo, 19 de outubro de 2014

Navio Bagé

     Faz um tempo andei cabisbaixo, pensando na vida mais que o usual. Havia recebido más notícias do navio Bagé, petroleiro dos bons, ao qual acompanhei a construção em um estaleiro carioca, tornou-se sucata. Lembro-me das manhãs em que chegava ao estaleiro Ishibras, e via aquelas centenas de trabalhadores fazendo exercícios matinais antes de irem para seus postos de trabalho. Era uma empresa japonesa de hábitos espartanos aquele estaleiro. No longo caminho até o navio ainda se via enormes galpões para testes dos motores do navio. Lá pela metade do ano de 1985 o navio estava pronto e saiu para a sua prova de mar, um teste para se verificar se o barco cumpria o desempenho contratado. Fomos até o Caribe, à ilha de Curaçao, para limpar o casco e por ali mesmo, próximo à ilha de Aruba, fizemos a prova e saímos a navegar por mares azuis.

     Agora o Bagé não é mais navio, tal qual casa de infância que foi demolida. Restam as fotos e as melhores lembranças. Mas cá para nós, como é bom ter lembranças como estas, não é?

Créditos de imagem: http://desenhotecniconaval.blogspot.com.br/2012_09_09_archive.html

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Tempos de mar

     Nos tempos em que estive embarcado em navios químicos um acontecimento era digno de muita atenção, a preparação para carregamento de álcool na Argentina. Os tanques eram lavados exaustivamente e fazíamos intermináveis testes de antepara para verificar resíduos de cargas anteriores. Descíamos as escadas dos tanques com todos os equipamentos teste, tubo de ensaio, água destilada, álcool e uma pequena lanterna. Tentávamos adivinhar todos os cantos onde o temível inspetor argentino colocaria seu olhar diabólico. Ao chegar ao porto de Campana lá estava o sorridente e previsível inspetor, Sr. Alfredo Suppa. De sorriso fácil, grande simpatia e conhecido já por todos a bordo, ele descia aos tanques para logo achar o erro que tínhamos certeza não existir. Subia sorridente, gentil, argentino, e solicitava outra lavagem do tanque. Como expressar a raiva àquele inspetor, que era certeiro e gentil em seus "nãos"? Tal gentileza lembra-me de como às vezes somos cruéis em própria correção, como se fôssemos a pior das pessoas, o maior dos inimigos marginais.