quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

O novo

     Então que eu me permita ao novo tal qual o sujeito nômade em terras desconhecidas. Que os encontros sejam anônimos mesmo com quem imagino conhecer. Que eu me permita ficar saudável mesmo quando meu corpo apresentar minha história. Desejo a todos as melhores escolhas e as decisões mais sábias.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

O navio é

     O navio é uma máquina, se bem que não é. O navio é um peixe que sabe viver fora d'água, então peixe também não é. O navio tem asa, mas não voa, então voador não é. Quando bate aquele vento de través ele vira apito, faz assobio por todo o lado e também apita, mas inteiro apito ele não é. O navio tem boca, mas não fala nem dele, nem dos outros. O navio é uma coisa que não é.

     Coisa que não é causa coisa que não sei no corpo da gente. Assim, um tipo de coisa esquisita, um sei lá com cheiro bom e gosto de mar. Por isso marinheiro balança, para ajeitar as coisas no corpo. Essas coisas que não tem nome, mas que dão ondas no mar de dentro. Agora quem quer embarcar sou eu.

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Peixe-voador

     Olhando o peixe-voador de perto, você pode ver que ele tem um tipo de asa. Olhando-o de uns metros para trás, do lado do costado do navio, ele parece voar uns metros e voltar a mergulhar. Já a ciência diz que o bicho voa para escapar de bicho maior, dá um salto e plana feito um passarinho de asa bem aberta. Vez ou outra o bichinho se engana e aterrissa no convés do navio. Se isso acontece pela noite não tem jeito, morre sem o apressado marinheiro lhe salvar. Se for de dia tem o marinheiro, bom moço, que corre a jogá-lo de volta ao mar. Simples assim.



quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

A noite

     A noite, no mar, não vem do céu. É a escuridão do fundo d'água que sobe, empurrando o sol para trás do horizonte. Ela sobe trazedora de segredos, para desassombrar o bom marinheiro. Aí, quando o sol consegue crescer do outro lado, o marinheiro escolhe que segredo quer enxergar. Os outros ele joga de volta ao mar. De dia, quando vê sua sombra, lembra-se da batalha dos segredos emergentes e se põe a caminhar. Ao longe ruiva sereia pensa a hora de se aproximar e cantar.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

A feminilidade


     Dos instantes da mais presente falta é o da despedida da mulher à beira do cais. Não se sabe quando volta, não se sabe como ela vai ficar. O navio a apitar silêncios de ausência, o olhar, despido de tudo, a escorrer gotas de amor. E a mulher, reconhecida em sua feminilidade, liberta o encontro da dor.

domingo, 23 de novembro de 2014

Chuva

     Choveu muito sobre o navio. Era dia de calor em mar tropical. Cada gota lavou o sal das lágrimas do mar que sobraram a procurar descanso e alimento no convés. O mar do céu, quando desce, mata a sede das ondas, lava a alma do navio. O mar de baixo se adoça nestas horas e, bem depois, se aperta, se espreme, para mandar fumaça d'água para o céu. Quando junta tudo lá, que a gente chama de nuvem, chove muito sobre o navio. Prestando bem atenção tudo isto tem cheiro, tem cor e barulho. Marinheiro com saudade de casa chora escondido feito peixe na água, sem pena e lava a alma do navio, também...