Ao
chegar em porto de França o navio embarcou um container de carga
especial. Era final de inverno de 1984 e o frio já não mais congelava o
convés. Com a carga toda segura e a Biscaia pela frente, seguiu para
Leixões, no norte de Portugal. Lá carregou cortiça para as garrafas
brasileiras. Logo pela manhã o Prático embarcou para uma rápida manobra
de desatracação, desembarcando em seguida do navio
que seguia rumo ao Rio de Janeiro. Menos de duas semanas depois o
container desembarcava em precária doca carioca. Em confusa agitação
alguém gritou lá do cais que algo miava dentro do enorme caixão de
ferro. A alegria correu ouvidos de todos os marinheiros embarcados.
Relata o maquinista que levou o bichano para casa que este ainda viveu
bem as cinco vidas lhe sobraram. Ao bichano aquilo que lhe parecia um
funeral era o início de outra vida.
domingo, 13 de abril de 2014
quinta-feira, 10 de abril de 2014
Vez
ou outra, durante uma travessia, subia ao passadiço um tripulante
disposto a conversar qualquer assunto. Isto tornava o quarto de serviço
mais agradável e mais rápido. Não raro eram assunto os sonhos de
futuro, de guardar dinheiro, de comprar uma casa para mãe, de ver os
filhos crescerem e frequentarem boas escolas. Por vezes reclamavam do
trabalho a bordo, de seus chefes a darem ordens sem pudor
ou respeito. Em outras contavam histórias de outros tripulantes com
quem embarcaram em tempos anteriores. Uma conversa leve , geralmente de
bom humor, corria oceano afora. Em muitos dias ninguém aparecia
naquelas quatro horas e a imaginação cobria a falta da boa conversa. Na
chegada do navio ao porto o ritmo era outro, mais rápido, mais sério e
sem tempos para conversas. Quando o navio saia em travessia novamente,
subiam os marinheiros para contar suas aventuras e, em especial, as
divertidas graças e desgraças em terra foram participar. Ali, naquele
momento, nenhum lugar do mundo era melhor de se estar. Um a testemunha
da existência do outro, sem se pensar ou se sentir necessidade da eterna
felicidade.
domingo, 6 de abril de 2014
Do
alto de um navio enxerga-se o horizonte até o limite dos olhos e da
curvatura da terra. Em bons dias de olhar se vê a Jamaica passar
lentamente por boreste, Jacarta por bombordo, Cidade do Cabo por boreste
e Órion a acenar pela popa. Nestes bons dias o marinheiro vê-se a
sentir o cheiro do barulho quente do vento alisar o mar.
quarta-feira, 2 de abril de 2014
Navegando
pelo golfo da Biscaia no inverno de 1983 encontramos um mar grosso de
primeira, daqueles que marinheiro tem orgulho em contar. Dois dias
depois, sem dormir e com o dedo cortado na tentativa de descascar uma
fruta durante um balanço, o orgulho já tinha sido lavado em água salgada
e desisti de ser marinheiro. E outras tantas vezes desisti do mar até
cansar de desistir. Não é possível desistir tão fácil daquilo que
balança e corre em nossos veias.
Assinar:
Postagens (Atom)